terça-feira, 31 de maio de 2011

Yes, we can..


Yes, we can..

Ai ai, ô vidinha difícil. Hoje cheguei de viajem pela tarde com uma gripe chata se aconchegando em mim. Um daqueles dias que dá vontade de tirar folga e recarregar as baterias depois de dois dias fora de casa. Mas hoje é sábado, e meus queridinhos nunca têm pena de mim num sábado.

Mal cheguei em casa e já tinha que sair de novo. Cliente "porreta", daqueles que não dá pra recusar. Era fim de tarde e lá ia eu pro Del Rey atender meu primeiro cliente do dia.

Ele me cobrou novas postagens no blog. Realmente faz mais de uma semana que não escrevo aqui. Disse a ele que tinha vários textos inacabados no celular, o que faltava é tempo pra finalizar e postar. Normal, vocês já devem estar familiarizados com minhas desculpas esfarrapadas.

Esqueci de dizer que antes de chegar no motel já tinha mandado um outro cliente ficar a ponto de bala, no gatilho, me esperando uma hora depois. Sou sincero, não escondo a forma como administro meu tempo, meus "negócios". É, parece que estou ficando cada vez mais empresário.

Brincadeiras à parte, mandei ele ir pra lá também uma hora depois. E uma hora depois, quando me despedia da "realeza", saia de um quarto e andava em direção a outro. "Yes, we can!"

Na cama, faço a "balisa" do mesmo jeitinho, e estaciono na garagem com perfeição. Estou craque na direção já rsrs.. Hoje meu duplo sentido está tilintando.

Não quis esperar o taxi pra ir embora e fui andando em direção à saída do motel. Muitas vezes faço isso, não suporto esperar o taxi que as meninas da recepção chamam, eles sempre demoram. E muita gente já deve ter me visto saindo andando dos motéis, tô nem ai, eu podia tá roubando, eu podia tá matando, eu podia tá.. Bem isso eu acabei de fazer.

Enquanto caminhava, já umas dez e tantas, depois de dois encontros consecutivos, papai do céu achou que ainda não era o bastante, e manda outras trocentas pessoas ligarem naquela hora. Uma dessas acaba ganhando o bingo e me convence a permanecer ali. Pensei comigo mesmo, será que não vou sair daqui hoje?

Enquanto espero encostado numa árvore próximo a entrada do motel, escrevo estas primeiras frases. Ele acabou de me ligar, "quarto 120". Agora estou andando, digitando no celular que nem um louco. Ops, passei do quarto, me perdi. Ninguém vai ligar se eu pisar nessa graminha aqui né. Não, não me olhem, finjam que sou uma estatua de decoração. Cheguei, humm, carrão. "Oi, posso entrar..?"

Três clientes seguidos e no mesmo motel. Acho que vou pedir comissão ao dono daquilo lá. Mas enfim, noite longa e missão cumprida. Adoro trabalhar assim. O curioso é que muitos clientes já estão pedindo para ter suas experiências comigo sendo contadas no blog. Imagina, se eu fosse entrar em tantos detalhes eu não ia sair mais da frente do computador.

Tenho uma novidade. Na quinta-feira fui dar uma entrevista pra um jornal impresso aqui de Salvador, um grande jornal. A matéria foi sobre a minha idéia de criar um blog e contar de forma criativa e inusitada a rotina do Gabriel Ferrari. A minha rotina. Deve rolar algumas fotos minhas também, sem rosto é claro. Ficaram de me avisar quando ia ser publicada e ai aviso aqui no blog.

Lembrei de um email que recebi outro dia, "Você é minha Bruna Surfistinha de pênis!". Ri litros. Pô, ai você força a amizade né.

Não sei bem como vai ser a repercussão de tudo isso. Muita gente já lê o blog, gente do mundo inteiro. Nunca me acostumo com isso. São mais de 5 mil acessos em dois meses. Mas espero que mais gente possa conhecer este espaço, possa rir comigo, matar a curiosidade e ser seduzido por esse furacão louco.

E que cada um que leia isso aqui, ou qualquer outra coisa sobre essa profissão, entenda que todos nós somos iguais, acompanhante e cliente, e que não somos só um simples pedaço de carne ou "um rostinho bonito na TV". Todo ser humano é capaz de surpreender o outro.

"Esse seu profissionalismo.. menina isso me dá um tesão.."

Gabriel "Surfistinha" Ferrari, rai ai..

domingo, 29 de maio de 2011

C-300


C-300

Ontem trai a mim mesmo. Mas não pude resistir. Passei a noite dirigindo uma Mercedes, rsrsrs..

Estou a poucos dias de terminar minhas aulas de direção, mas a ansiedade de enfim sair e buscar minha liberdade em 4 rodas já é sufocante. Ontem me convidaram a passear pela orla de Salvador dirigindo uma Mercedes C-300, uma máquina e tanto. Você resistiria? Nem eu. Louco e irresponsável, eu fui. Eu parecia um garotinho ganhando presente no dia do aniversário. Os olhos brilhavam e a boca aberta demonstrava medo e insegurança, mesmo assim acabei pegando o jeito e não perdi nenhum pontinho na carteira.

Antes disso, mais uma celebridade baiana desfrutava da companhia deste que vos fala. Rosto conhecido que logo identifiquei das revistas de notícias da nossa capital. Quando falei que o reconheci ele ficou até sem jeito, mas até que adorou o reconhecimento. "Estamos famosos" ele disse.

Não, não quero fama alguma. Quero bons comentários e o reconhecimento de um trabalho bem feito. Minha namorada não gosta da idéia de escrever no blog, ela tem medo que um dia façam um filme também (droga, ela adivinhou rsrs..) ou que a exposição venha a nos prejudicar. Mas ela não lê o blog, se lesse, saberia que o que conto aqui não faz mal algum.

Mas é engraçado ver a repercussão de tudo isso. Outro dia fui atender um cliente, um garoto, devia ter pouco mais de 20 anos. Foi como se eu fosse a Ivete Sangalo ficando nua na frente do seu líder de fã clube. Ele sabia cada palavrinha que já escrevi aqui, tremia só de encostar em mim. Acho que provei pra ele que meu pôster merece ficar na parede do seu quarto.

Por incrível que pareça, ainda tem gente que duvida se sou mesmo eu quem escrevo aqui no blog. Dá vontade de dizer "Não, sou semi-analfabeto. Contratei o Stephen King pra criar umas lorotas e postar aqui nas horas vagas."

¬¬

Claro que sou eu quem escrevo. Quem mais teria paciência de narrar tudo isso? Acho triste quando tentam estereotipar o tal "garoto de programa", achando que todo mundo que se prostitui tem de ser ignorante, só saber fuder ou nunca ter tido outras oportunidades na vida.

Não quero levantar bandeira nenhuma, não faço apologia à prostituição, não. Apenas não acho que deva ser tão marginalizada quanto já é.

Não indicaria esta profissão a ninguém. É preciso se desprender de muita coisa, de muitos preconceitos para que possa embarcar nessa vida louca.

Nunca me faltaram oportunidades, eu tinha um bom trabalho. Mas o tempo vai passando e a gente fica com medo de perder o trem da vida. De não chegar lá. Sempre quis mais, sempre fui ambicioso. Por essa razão estou aqui, porque estou disposto a passar por tudo isso para conseguir o que procuro.

Mas vá lá, não posso me queixar tanto assim. Está tudo indo nos conformes e agradeço sempre pelos resultados alcançados. Hoje posso dar rumos melhores a minha vida.

E tudo isso com muito suor. Suor bem gasto nas camas de motéis, satisfazendo desejos e pecados como um Íncubos travesso.

E gozo só de ver você gozar..

Gabriel Ferrari.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Vila do sossego..

 Vila do sossego..

Olá queridos leitores. Peço que me perdoem por estar um pouco ausente. É que estou numa correria que só. Têm o trabalho, auto-escola, três livros que consomem minha atenção, namorada, viagens, e ainda estou ajeitando documentos pra finalizar a compra do meu "calhambeque bi bi..".

Descobri que é quase impossível conseguir fazer alguma coisa sem ter meios de declarar sua renda. Infelizmente este meu ofício não tem carteira assinada, não tem movimentação bancária, a não ser que eu faça. E provar que ganho um salário de "deputado" se torna uma odisséia.

Preciso do carro. Gasto mais de mil reais por mês em taxi, não dá pra continuar assim. Mas as coisas estão se encaixando, e em duas semanas poderei ocupar a minha garagem.

Me perco às vezes sobre o que fazer com este blog. Ora o uso como diário pessoal, não me importando em relatar bobagens do cotidiano, ora descrevendo de forma simples e descontraída como me deito em camas desconhecidas realizando desejos insaciáveis de pessoas que nem sei o nome.

De qualquer forma escrever pra mim é como gozar, onde minhas frases seriam todo o gozo que sai de mim no final.

Mas existe uma magia nisso tudo. É uma delícia se sentir desejado e mais gostoso ainda satisfazer uma pessoa. Sentir que seus movimentos causam arrepio no outro, que sua respiração tem poderes sobrenaturais, ver a pessoa gozar e sentir a descarga de adrenalina percorrendo todo seu corpo até ela parar, exausta. Ali você é um deus, uma força divina que causa ebulição por onde toca.

Este fim de semana fui convidado a ir à Praia do Forte. Sempre quis conhecer aquele lugar. Fui à trabalho, é claro, não posso me dar ao luxo de tirar férias. Então por isso minhas viagens sempre trazem uma dupla satisfação. Adoro viajar, trabalhando melhor ainda.

Ficamos num resort, o melhor do lugar, assim disse a cliente. E era mesmo. Vários apartamentos se dispunham juntos em volta de um jardim imenso, com uma enorme piscina com uma vista maravilhosa do mar. Tudo merecia adjetivos. Tudo era lindo. O barulho do mar, a paz e tranqüilidade. Praia do Forte é um sonho de férias que nunca acaba.

Saindo de Salvador, pegando a estrada e indo pro norte, você encontra no caminho uma entrada para uma reserva. Praia do Forte. Aquilo funciona como uma pequena cidade, pequena mesmo. Com várias pousadas e resorts de luxo espalhados próximos ao mar. Rodeada de vegetação e rios a vila permanece escondida tornando aquilo tudo um paraíso tropical.

Existe uma vila, com pequenas ruelas onde não entram carros, só a pé. Centenas de lojas, bares e restaurantes tornam essa vila um verdadeiro shopping center a céu aberto. Têm de tudo, farmácias, mercados, lojas de grifes conhecidas, joalherias, restaurantes com aquelas mesinhas de madeira à beira da rua, tudo pra não deixar nenhum turista botar defeito. E como tem turista. Escutei quase todas as línguas ao longo do caminho.

Passei dois dias maravilhosos com uma companhia, diga-se de passagem, de rainha. Um ótimo lugar pra se passar férias, pra fugir um pouco da cidade, do trânsito, do barulho. Quero voltar lá sempre.

São essas coisas que fazem este trabalho valer à pena. Não só pelo dinheiro, que é muito bem vindo, obrigado. Mas as pessoas que conhecemos no caminho, as que valem à pena. As experiências e histórias que vamos vivendo. Conhecer e entender o ser humano é o verdadeiro trabalho por trás de todo o encanto e luxúria na vida que levo.

Espero sempre encantar as pessoas, assim como as pessoas me encantam. Obrigado a todos por partilharem dessa magia comigo.

Gabriel Ferrari.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Tô pagaaaanu..







Tô pagaaaanu..

Li numa revista que quem mantém uma vida sexual ativa (três vezes por semana) pode rejuvenescer a aparência em até 12 anos. Incrível, então mais um pouco e eu volto a ser um espermatozóide.

Fiquei meio sem tempo de escrever esses dias. Acabei postando aqui alguns textos que escrevo nas horas vagas, textos onde não relato o dia-a-dia do Gabriel. Só pra encher chouriça mesmo rsrsrs. Que bom que gostaram.

E pra aqueles que perguntam sempre, não, não fiz faculdade. Ainda. Quero tentar Publicidade, agora nos próximos vestibulares.

O gosto por escrever veio desde sempre. Sempre fui mais introspectivo, mais pra dentro. Quando eu tinha uns poucos aninhos de vida, e ainda dormia em um berço, a minha irmã mais nova ao acordar saia de forma mágica do seu berço e tocava o terror na casa enquanto minha mãe dormia. Eu acordava e ali mesmo ficava, entretido com brinquedos e outros detalhes.

A curiosidade e a boa leitura podem ser grandes faculdades pra qualquer um. O conhecimento é o maior bem que o ser humano pode ter. Pode ser a maior arma também, tanto pro bem como pro mal. Basta saber usar.

Bom, mas se a graça do blog também é ler sobre as minhas peripécias, vamos lá.

Essa semana fui atender um casal. É sempre uma surpresa quando isso acontece, é interessante ver o comportamento de um casal nessas horas. Fico imaginando como eles chegaram ao ponto de assumir a vontade de dividirem sua intimidade e fantasias com uma terceira pessoa. Imaginar isso chega a ser muito excitante.

Sou totalmente ciente de que isso é e sempre será uma coisa natural. Assim como todo resto de fantasias existentes na cabeça das pessoas. Estou acostumado com tudo isso e acho até interessante.

Já tive outras experiências com casais nesse trabalho. Com duplas de amigos, de amigas. Não tem segredo. Pode ser os dois ao mesmo tempo ou um de cada vez, tanto faz.

Tem de tudo. Tem aqueles que ficam de longe só olhando, os que participam, os que gostam de "finalizar", os que escutam atrás da porta, os que aproveitam e experimentam coisas novas, e os que simplesmente gostam de agradar o parceiro, realizando suas vontades. Tudo é válido. Tudo é um elixir para melhorar um relacionamento.

O lance é que cada vez mais casais me ligam. Talvez porque leiam o blog e sintam que dou mais segurança, talvez, me disseram isso outro dia. O importante é que não tenham medo de tentar, que não tenham vergonha de variar um pouco na hora do sexo.

Fico meio dividido às vezes entre fazer o que quero e fazer o que preciso fazer. Não que eu não queira fazer o que faço. Eu gosto do meu trabalho, gosto de dar prazer às pessoas. Mas de vez em quando preciso sacrificar minhas vontades pessoais. Faço de bom grado, e sem "choramingar", como diz o Felipe. Escolhi esse caminho e sei dos sacrifícios.

Mas essa semana deu um aperto no coração. Estava a um mês esperando chegar a quarta-feira, dia 4. Quando um escritor paulista que eu sou fã de carteirinha veio fazer uma tarde de autógrafos aqui na Livraria Cultura do Salvador Shopping. Fiquei sabendo de última hora que ele só ficaria duas horinhas assinando e fazendo sala para o pessoal.

Só que nessas duas horas amigo, eu tinha que estar em outro lugar, assinando com outra "caneta".

Até cheguei a ir com meu livrinho embaixo do braço. Mas pra tudo nesse mundo existe fila e eu não tinha tempo. Mestre "André Vianco" que me perdoe, mas nosso encontro ficará pra próxima.

"Sou teu fã desde sempre. Todos os seus livros moram na minha estante. E se eu escrevo hoje é porque você me ensinou. Obrigado." Digo isso em voz baixa olhando-o de longe e volto para a minha estrada de tijolos amarelos.

Segui a estradinha até chegar no Corredor da Vitória, um dos bairros mas ricos e tradicionais de Salvador. O destino era um daqueles edifícios que tem escrito "mansão" antes do nome. "Acho chique".

Algo me corroia por dentro de curiosidade, o nome da cliente me era muito familiar. Enquanto repetia o nome para o porteiro tentava lembrar de onde conhecia aquele apelido. Era alguma artista? Gente famosa? Empresária de alguma dessas bandas de axé? Não lembrava, não lembrava.

A entrada era discreta, mas tinha seu charme. Entrei no elevador e subi os andares, mais curioso que de costume. Um apartamento por andar. Sai do elevador, encontrei a porta e dei duas batidinhas. Segundos depois atrás de mim uma parede branca se abriu. Uma parede! Que tipo de gente tem a porta de casa como uma parede?

Uma governanta me convidou a entrar e pediu que eu aguardasse. Quando entrei dei por conta de que estava entrando na casa de alguém muuuito rico. Aquilo parecia um palácio. A sala era colossal, repleta de móveis caros, estampas francesas, objetos de prata, quadros, cores, e uma infinidade de detalhes que não posso descrever aqui. Lindo. Majestoso. Mas acolhedor.

Eu estava sozinho. Fui até a varanda e lá a mesma coisa. Meu apartamento cabia inteirinho naquela varanda, e olha que meu "ap" é bem grande. Algumas plantas decoravam o lugar deixando o clima mais tropical tomar conta. Mas o que mais arrepiava era que uma parede inteira não existia. No lugar tinham imensas janelas de vidro que se estendiam de uma extremidade a outra da varanda. E então eu era abençoado com aquela vista maravilhosa do mar. A Baia de Todos os Santos inteirinha aos meus pés. Aquilo era de dar inveja.

Lá embaixo, o edifício terminava no mar, numa daquelas pequenas marinas onde algumas lanchas poderiam atracar. Muitos dos prédios naquela costa tinham essa opção. Quase todos desciam até o mar.

Esperei então contemplando aquilo tudo. Quarenta minutos se passaram e eu já estava andando de um lado ao outro, inquieto. Não tive coragem de chamar a governanta e perguntar pela minha anfitriã, fiquei com medo de quebrar algum protocolo.

Comecei a pensar todo tipo de coisa. Será que o fetiche dela era ver alguém babando encantado com seu apartamento? Será que ela estava me olhando através de câmeras escondidas? Cheguei a procurar algumas com os olhos. Porque demorava tanto?

Mas acho que estava entendendo um pouco. Quando algumas pessoas ficam ricas daquele jeito perdem a noção do tempo. Passam a viver num outro mundo.

Até que ela veio, toda arrumada e perfumada. Trazendo um charme e uma elegância digna de bom gosto. Sentamos pra conversar e logo aquela imagem que eu tinha foi se desmanchando, ela foi se mostrando uma pessoa maravilhosa e com uma humildade natural, diferente daquilo que ostentava. As pessoas te surpreendem quando você menos espera.

Conheci o resto do apartamento, conheci a história da sua vida, e me encantei com sua personalidade. Uma pessoa que com certeza vai marcar para sempre. Passamos a madrugada inteira dividindo experiências, mas o sexo também não ficou de fora.

Lembrei da "Lady Kate" do Zorra Total e queria que ela me visse ali naquele momento, literalmente "entrando" na High Society.

O trabalho tem dessas coisas. A gente não só faz sexo, beijo e tchau. Se você tiver sorte, e "axé" como dizem alguns, acaba conhecendo pessoas maravilhosas, lugares incríveis, histórias de vida que te ensinam a cada novo encontro.

Você vai conhecendo um mundo a sua volta, maior do que imaginava. Vendo e experimentando coisas que talvez nunca tivesse a oportunidade, levando uma vida normal.

Nessa viagem o caminho pode te trazer coisas boas ou ruins. Basta você escolher o que vai trazer de volta na bagagem.

( “Bebel, minha plima, estou-me aqui num lugar fantárdigo..” )

Gabriel Ferrari.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Fome


Fome

O animal caminha vagarosamente até sua presa. Ele sente o cheiro do sangue mais de perto e logo deixa de lado a cautela rendendo-se ao instinto primal. A fome.

Caído ao lado da raiz de uma frondosa árvore, jaz um coelho morto e de seu ventre suas tripas vertem de um corte feito à faca. Sangue mancha o chão. Sangue impregna o ar. O grande Javali não demora em se lambuzar nos primeiros pedaços de carne que escapam da ferida. A isca deu certo.

Iluminado pelos primeiros raios de sol da manhã no alto da mesma árvore, o homem observa sua presa, imóvel. Ele espera o melhor momento de saltar sobre o imenso javali. Uma gota de suor se desprende da testa do homem, escorre até o queixo e despenca no ar. A gota acerta em cheio uma folha próxima ao chão repleta do orvalho matinal.

O animal sentindo alguma coisa respingar em seus olhos se irrita e solta um grunhido alto na floresta silenciosa. Com o susto o homem se desequilibra e deixa cair uma pequena bolsa de couro que trazia na cintura. A bolsa bate no solo com estardalhaço e o javali dispara fugindo da armadilha.

O homem corre por um dos troncos horizontais da árvore e salta mirando o animal em disparada. A lâmina da faca penetra o lombo do javali, mas este não pára de correr. O caçador é arrastado na frenética fuga lutando para não se soltar.

Caça e caçador despencam num pequeno barranco até baterem no caule da raiz de outra árvore. Os dois param por um instante e se encaram. Então o javali ataca.

Os gigantescos caninos do animal não rasgam por pouco o rosto do caçador. Este segura com uma das mãos o perigoso canino exposto do bicho. O Javali de 180 quilos se debate procurando se desvencilhar do caçador e ataca guinchando e avançando.

O homem cai no chão tentando manter o focinho do animal longe do seu rosto. A força e a ferocidade da criatura são tão grandes que por um segundo o imenso animal parece estar levando a melhor.

Um grito feroz explode das entranhas do homem acuado. Com um movimento rápido ele apanha um galho caído no chão ao seu lado e com toda a sua força enfia a arma improvisada no olho direito do animal, atravessando o crânio de um lado ao outro. O javali cai morto na hora.

O caçador permanece alguns segundos deitado ao lado do seu troféu respirando e tentando recuperar as forças.

A luz do sol agora iluminava toda a mata. Após dois dias caçando nas florestas geladas daquela região esquecida, era hora de voltar para casa. O caçador era e continuaria sendo o melhor naquilo que fazia.

Gabriel Ferrari.

Três lágrimas na janela

Três lágrimas na janela

Ventava pouco àquela hora. Algumas nuvens se juntavam no céu prometendo uma chuva. Talvez eu devesse ter vindo em outra noite. Talvez ela já estivesse dormindo. Mas, se eu pudesse falar no ouvido dela enquanto ela dorme talvez ela entenda, talvez ela acredite...

Uma luz repentina clareou a janela. Alguém acordou no quarto. Tento não me mexer, nem imagino o que ela iria pensar se chegasse à janela e me visse agachado em cima do muro do seu prédio. A luz iluminou o lugar onde eu estava no muro, mas por sorte, se apagou de novo. Fiquei mais aliviado, alarme falso. Não pude ver quem era andando no quarto, mas vi uma mão afastar um lado da cortina, deixando o vento entrar... e um barulho familiar chegar aos meus ouvidos.

Tentei me concentrar no som, era um choro, alguém estava chorando. Era ela, eu sabia, mas porque ela chorava? Por que estava triste? Como eu queria dizer tudo para ela agora, como eu queria contar quem eu sou e porque estou fazendo isso. Como vou poder ajudá-la se sei que ela vai ter medo de mim...

Mas ela me chamou, ela pediu que eu viesse. Ela precisa de mim... e agora eu preciso dela também. Sei que não podia ter deixado isso acontecer, mas aconteceu. Sei que é impossível ficarmos juntos, somos diferentes. O que ela sabe sobre mim? Para ela eu sou apenas um cara que ela conheceu na rua por acaso dias atrás. Mas ela não sabe. Não sabe que eu a conheço desde sempre.

Uma lágrima desliza em meu rosto e cai nas costas de minha mão. Para falar a verdade eu não sabia que podia chorar. Incrível ver que uma parte de mim ainda é humana.

Continuo ouvindo a tristeza dela, entre um soluço e outro ouço ela me chamar de novo. Com lágrimas nos olhos eu a ouço deitada na cama, falando baixinho para mim "Me ajuda, tira essa dor do meu peito, eu não quero mais sofrer, não de novo..."

Outra gota pinga em minha mão, eu falo baixinho também sem me importar se ela vai ouvir "Eu estou aqui agora, você me chamou e eu vim, e nunca vou te deixar, não chore mais, por favor..."

Nesse momento minha camisa rasga nas costas, deixando crescer aquilo que as pessoas não podem ver. Fico de pé no muro, minhas asas estão prontas. Com um impulso silencioso desloco o ar atrás de mim, sobrevôo lentamente à distância até alcançar a sua janela. Todos estão dormindo. Paro tranquilamente no ar, suas cortinas balançam levemente com o vento. Toco o parapeito com as mãos e coloco a cabeça para dentro do quarto. Ela ainda chora, com a cabeça enterrada no travesseiro. Ela nem me percebe levitando em frente a sua janela. Inclino minha asa direita para frente, escolho a mais bonita das penas, e num gesto confuso de amor e compaixão, arranco um pedaço de mim.

Outra lágrima cai agora no parapeito da janela. A dor passa rápido, solto a pena e peço ao vento que a leve para ela. O meu presente pousa suave no seu travesseiro, ela se vira assustada, eu não estou mais ali. Cruzo o ar como uma sombra silenciosa. Escondo-me numa árvore do outro lado da rua, ainda vejo a janela dela daqui.

Sinto-a tocar a pena com as mãos, sinto o olhar de curiosidade dela ao ver aquilo. Como que por impulso ela se levanta, caminha lentamente até a janela entre aberta. Pôe a cabeça para fora e não vê ninguém, nada. Nenhum pássaro, nenhum anjo... 

Triste, ela abaixa a cabeça, seus olhos sem querer encontram uma coisa que antes não estava ali. Minha lágrima, a gota que chorei quando arranquei um pedaço de mim. Aquela gota era para ela também. 

Ela sorriu por um instante, olhou para o céu, que agora derramava suas primeiras gotas de chuva, olhou de novo para a lágrima que deixei. Um olhar triste tomou conta dela de novo, talvez ela tenha achado que foi a chuva que chorou em sua janela... ou talvez não.

Fechou a janela, a chuva aumentava. Pude sentir ela colocar meu presente embaixo do travesseiro, e pude ouvir ela dar um último suspiro antes de adormecer.

A chuva cai forte sobre mim, molhando minhas asas, meu corpo, meu rosto... Não sei se estou chorando ainda. As gotas que caem agora podem ser lágrimas ou chuva, não sei. Mas sei que estou aqui agora... estou aqui por ela... para ela... E nenhum mal jamais irá lhe acontecer.

Gabriel Ferrari.

Meia-Noite

Meia-Noite

Abriu os olhos.
O teto escuro do quarto parecia conter desenhos estranhos,
sombras vivas que se mexiam de lá para cá.
Sombras.
Deitada na cama viu o teto se transformar numa superfície gelatinosa,
negra, com ondas se movendo nervosas, vivas.

Mãos começaram a surgir do teto escuro,
enquanto gotas negras pingavam em seu rosto e corpo.
Estava congelada, não conseguia se mexer.
Se alguém a tocasse naquele momento podia jurar que ela era feita de gelo.
Uma gota pingou na sua boca, sentiu nojo, era gosto de sangue.

Sangue.

O teto tinha se tornado um rio de sangue.
Uma mão. Um braço. Dezenas de mãos famintas.
Uma criatura sem rosto escorria vagarosamente
até chegar a poucos centímetros de seu rosto.
Não havia boca, nariz, olhos.
A criatura estendeu o braço e com uma das mãos tapou a boca e o nariz dela.
Mão fria tinha o mostro.

O ar começou a faltar, não conseguia se mexer, só os olhos dançavam desesperados procurando socorro. Ia morrer, tinha certeza que ia morrer.
Uma lágrima escorreu de cada olho. Pânico. Medo. Uma dor cresceu no peito.
Ia morrer. Ninguém ouviria seu pedido de socorro...

Fechou os olhos com força e implorou para que a dor parasse. Tão nova. Tão linda. Nunca duvidou dos seus medos, todos eles pareciam tão reais.
Abriu os olhos e levou um susto. Não havia mão, nem criatura.
O teto continuava branco e sem graça. Podia mexer o corpo, podia respirar de novo.

Olhou para o relógio.
Meia-noite.
A mesma hora todo dia. Toda noite era isso.
Era só um sonho.
Um maldito sonho..

Gabriel Ferrari.

terça-feira, 3 de maio de 2011

Todo mundo pede bis..







Todo mundo pede bis..

“Oi, como vai você?”

Humm, ânimos exaltados no blog, adoro..

Hoje uma cliente minha confessou que me traiu. Calma, foi só uma fugidinha, rsrsrs.. Ela comentou que num dia me ligou e não me achou, coisa que infelizmente está ficando freqüente (queria me dividir em dois, três..). Então ela chamou outro colega do site e quando ele chegou lá, parece que ele a reconheceu de alguma passagem que contei por aqui. Incrível, tem gente que anda fazendo lição de casa. E que bom, porque parece que todo mundo está lendo isto aqui.

Parece um encontro de comadres, com direito a chá com bolachas no fim de tarde. Então já que é assim, sejam bem-vindos coleguinhas, sintam-se em casa.

Mas eu tô achando tão fofo tudo isso, tem cliente parando em casa antes pra dar uma “raspadinha” antes de me encontrar. Ô zênti, não precisava tanto..

Outro dia quase fiquei gripado. Num desses dias em que choveu que nem o dilúvio aqui em Salvador. Nenhum raiozinho de sol durante dois dias seguidos. E lá ia eu de taxi pra lá e pra cá.

Na quinta, uma e meia da tarde eu invadia sorrateiramente o hall de entrada do Hotel Pestana. Tenho que ser praticamente um ninja, um Jack Bauer, porque nem sempre eles deixam os hóspedes receberem visitas. Uma série de protocolos, um saco. Fiz cara de magnata, sacudi o relógio de ouro e subi.

Adoro os congressistas, eles ficam tão carentes longe de casa, mas se animam rapidinho quando comem um “acarajé” bem apimentado. “Almocei” no Pestana e fui embora. Peguei o taxi com destino certo já.

Cliente que repete o prato pela terceira vez é sinal de que gostou mesmo do tempero. E quando gosta se lambuza e pede bis. E o segundo cliente do dia teve “bis” três vezes esse mês. Fidelização minha gente, daqui a pouco vou ter que fazer carteirinha..

Não me chamem de fominha, sou apenas um workaholic. E se a Ferrari ainda tem gasolina ela pode correr. Com muito jeitinho peço ao cliente que me deixe num ponto de ônibus em frente ao Parque Costa Azul. Nos despedimos e eu, inocentemente como a Alice do País das Maravilhas, corri em direção ao coelho branco. O coelho passou apressado em frente ao Motel Villas e virou a esquina, viu a entrada do Motel Tramps e nem se abalou. Seguiu correndo virando outra esquina e entrando ofegante pela porta de vidro do Motel Le Plasier. Alice encontrou a toca do coelho.

Um cliente me esperava no quarto 208 fazia uma hora. Não fui eu que cheguei atrasado, ele que quis chegar antes, dizendo que quando eu estivesse livre eu fosse. Então eu fui. E lá dentro o chapeleiro maluco me esperava para mais uma xícara de chá. Tomei o chá das seis montado num touro, aquilo parecia um vulcão prestes a entrar em erupção. Tomei o sexto banho quente do dia espirrando. Vesti minha roupa peguei o “biscoito” em cima da mesa e fui embora. Aquele não foi um dia de muita conversa.

Parei no shopping pra fazer um lanche e outro cliente ligou perguntando se estava livre. Dei um sorrisinho de canto de boca, olhei pro contador de combustível, ainda dava pra mais uma viajem. Nos encontramos fora do shopping e ele já veio com aquele papo que eu já conhecia. Disse que tava sem muito tempo e que queria uma coisa ali no carro mesmo. Eu disse não, “Não trabalho dentro do carro.” Eu sou sincero, gosto de trabalhar de forma organizada, entre quatro paredes. Então preferi descer do carro e voltar pra casa. Melhor assim.

Dia corrido, dia muito corrido. E a chuva não dava trégua. A sexta-feira amanheceu que nem a quinta. Mas as coisas foram mais tranqüilas. Almocei com um cliente no Le Royale, depois de um banho quente naquela piscininha maravilhosa. Passei no shopping, dei uma volta, comprei um livro e uma hora depois lá ia eu de novo pro motel das piscininhas. Duas horas depois quando cheguei em casa, tirei a roupa e deitei na cama pra olhar o teto. Um estalo na cabeça. O livro. Merda. Tinha deixado a merda do livro no motel. Que lerdo, só fui lembrar depois. Acabei só indo buscar no sábado de madrugada, quando sai do Maxims, depois de passar quase duas horas conversando com um cliente sobre os planos de mercado da empresa que ele estava assumindo. Eu faço minha faculdade onde dá, tá..

O mês terminou, e veio a hora de fazer contas. Eu tenho um caderninho, onde todo dia anoto quem eu atendi e quanto essas pessoas me trouxeram. Anoto também tudo o que gastei nesse dia, desde um cachorro-quente, conta de luz, aluguel e principalmente quanto gastei de taxi.

Contas feitas e o resultado como esperado é de invejar qualquer funcionário público. É de arrepiar. Meses atrás eu não estava num site tão conhecido, como agora. Chegava a atender quatro, cinco, às vezes seis clientes num mês. Imagina. Era como tirar leite de pedra. Mas dava pra pagar as contas.

Hoje, eu chego a atender quatro clientes num só dia. Uma diferença absurda. Tanto em trabalho, como no valor acumulado. Me sinto um guerreiro voltando de uma missão bem sucedida. Não há sensação melhor do que ver o resultado imediato do seu esforço. A idéia de trabalhar pra si próprio, ser independente, não ter aqueles descontos altíssimos no fim do mês que comem metade do seu salário, essa sensação de dever cumprido é muito gratificante.

E pra aqueles que dizem que dinheiro fácil, vai fácil. É verdade. Eu acredito. Pois o meu vai embora facinho facinho daqui a alguns dias. Mas não me preocupo não, que nada, só vou sentir saudades de andar de taxi por ai..

Gabriel Ferrari.