quinta-feira, 5 de maio de 2011

Três lágrimas na janela

Três lágrimas na janela

Ventava pouco àquela hora. Algumas nuvens se juntavam no céu prometendo uma chuva. Talvez eu devesse ter vindo em outra noite. Talvez ela já estivesse dormindo. Mas, se eu pudesse falar no ouvido dela enquanto ela dorme talvez ela entenda, talvez ela acredite...

Uma luz repentina clareou a janela. Alguém acordou no quarto. Tento não me mexer, nem imagino o que ela iria pensar se chegasse à janela e me visse agachado em cima do muro do seu prédio. A luz iluminou o lugar onde eu estava no muro, mas por sorte, se apagou de novo. Fiquei mais aliviado, alarme falso. Não pude ver quem era andando no quarto, mas vi uma mão afastar um lado da cortina, deixando o vento entrar... e um barulho familiar chegar aos meus ouvidos.

Tentei me concentrar no som, era um choro, alguém estava chorando. Era ela, eu sabia, mas porque ela chorava? Por que estava triste? Como eu queria dizer tudo para ela agora, como eu queria contar quem eu sou e porque estou fazendo isso. Como vou poder ajudá-la se sei que ela vai ter medo de mim...

Mas ela me chamou, ela pediu que eu viesse. Ela precisa de mim... e agora eu preciso dela também. Sei que não podia ter deixado isso acontecer, mas aconteceu. Sei que é impossível ficarmos juntos, somos diferentes. O que ela sabe sobre mim? Para ela eu sou apenas um cara que ela conheceu na rua por acaso dias atrás. Mas ela não sabe. Não sabe que eu a conheço desde sempre.

Uma lágrima desliza em meu rosto e cai nas costas de minha mão. Para falar a verdade eu não sabia que podia chorar. Incrível ver que uma parte de mim ainda é humana.

Continuo ouvindo a tristeza dela, entre um soluço e outro ouço ela me chamar de novo. Com lágrimas nos olhos eu a ouço deitada na cama, falando baixinho para mim "Me ajuda, tira essa dor do meu peito, eu não quero mais sofrer, não de novo..."

Outra gota pinga em minha mão, eu falo baixinho também sem me importar se ela vai ouvir "Eu estou aqui agora, você me chamou e eu vim, e nunca vou te deixar, não chore mais, por favor..."

Nesse momento minha camisa rasga nas costas, deixando crescer aquilo que as pessoas não podem ver. Fico de pé no muro, minhas asas estão prontas. Com um impulso silencioso desloco o ar atrás de mim, sobrevôo lentamente à distância até alcançar a sua janela. Todos estão dormindo. Paro tranquilamente no ar, suas cortinas balançam levemente com o vento. Toco o parapeito com as mãos e coloco a cabeça para dentro do quarto. Ela ainda chora, com a cabeça enterrada no travesseiro. Ela nem me percebe levitando em frente a sua janela. Inclino minha asa direita para frente, escolho a mais bonita das penas, e num gesto confuso de amor e compaixão, arranco um pedaço de mim.

Outra lágrima cai agora no parapeito da janela. A dor passa rápido, solto a pena e peço ao vento que a leve para ela. O meu presente pousa suave no seu travesseiro, ela se vira assustada, eu não estou mais ali. Cruzo o ar como uma sombra silenciosa. Escondo-me numa árvore do outro lado da rua, ainda vejo a janela dela daqui.

Sinto-a tocar a pena com as mãos, sinto o olhar de curiosidade dela ao ver aquilo. Como que por impulso ela se levanta, caminha lentamente até a janela entre aberta. Pôe a cabeça para fora e não vê ninguém, nada. Nenhum pássaro, nenhum anjo... 

Triste, ela abaixa a cabeça, seus olhos sem querer encontram uma coisa que antes não estava ali. Minha lágrima, a gota que chorei quando arranquei um pedaço de mim. Aquela gota era para ela também. 

Ela sorriu por um instante, olhou para o céu, que agora derramava suas primeiras gotas de chuva, olhou de novo para a lágrima que deixei. Um olhar triste tomou conta dela de novo, talvez ela tenha achado que foi a chuva que chorou em sua janela... ou talvez não.

Fechou a janela, a chuva aumentava. Pude sentir ela colocar meu presente embaixo do travesseiro, e pude ouvir ela dar um último suspiro antes de adormecer.

A chuva cai forte sobre mim, molhando minhas asas, meu corpo, meu rosto... Não sei se estou chorando ainda. As gotas que caem agora podem ser lágrimas ou chuva, não sei. Mas sei que estou aqui agora... estou aqui por ela... para ela... E nenhum mal jamais irá lhe acontecer.

Gabriel Ferrari.

6 comentários:

  1. Gabriel, tá boa sua história. Só tenta usar menos reticências - não é errado, mas c tá usando em excesso.

    E vai treinando, cara, porque tu tem talento de sobra. Você tem um nível altíssimo de escrita. Se continuar crescendo desse jeito, já pode pensar em sair das crônicas para uma coisa maior, como uma novela ou romance.

    Você estudou formalmente até um nível bem alto ou tem essa qualidade toda porque lê muito?

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  2. serio, esse texto é demais adorei

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  3. Finalmente consigo tc do meu pc \o/ pois através do cel eu não podia postar comentário aqui no seu blog, e olha que "minha língua coçou" dias atrás rsrsrs... Mas, como diz o dito popular... O QUE A LÍNGUA FALA O CORPO PAGA, e sei que essa "conta" não é sua (nem minha) rsss...assim+como+vc <---(isso foi proposital rss), eu AMO RETICÊNCIAS \0/\0/ ja sabes que virei fã desse blog desde o comecinho, tdo aqui é bom de se ler, especialmente o que tu escreves, e o que a galera escreve tbm, engraçado que muitos dos coments feitos eu tbm pensei em fazê-los, mas não sabia como postar nessa paradinha rss... lembro até de alguém que postou que pagaria na boa teu cachê pra tomar um choop e bater papo ctg, e eu tinha pensado exatamente a msma coisa, isso sem dúvida é prova de que não llhe vemos "como um pedaço de carne" meu caro ;) felizes são aqueles que podem enxergar isso. E pra ser mais sincera ainda, até os comentários que não são lá "muito felizes" me fazem sorrir :D logo, tdo aqui vale a pena e com certeza o prazer é tdo NOSSO ;) rsss bjomeliga kkk

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  4. O título me lembrou uma música
    Você pode ir na janela - Gram
    música velhinha, mas q gosto bastante
    continue postando mais textos assim,
    gostei dos 3!

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  5. "pode entrar" falou de pagar cachê para tomar chopp e bater papo. Pura verdade! è sempre bom fazer as boas coisas da vida com boa companhia. E nesse quesito Gabriel é fenomenal!!
    Pena que não tive resposta. E aí Gabriel? topa? ou de fato o atendimento tem que ser entre quatro paredes.... Valeu!

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  6. Meus queridos.. eu trato de negócios por telefone. E ficarei muito grato de ajudar todos vocês, é só me ligar..

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